sexta-feira, 27 de junho de 2008

Fugaz


− Onde está?... Como?!... Perdeu-se?!

− Ficou pra trás.

− Não, você está enganada, eu o imaginava.

− Sim eu sei.

− Então? Como pode ter se tornado passado?

− Porque tudo passa, não mais existe no próximo segundo...


Fechei a porta, cadeado, o maior que encontrei. No ônibus, relógio no pulso, Atraso. Olho pro lado, passo, passou por mim. Minha atração de adolescência. Quantos sonhos...

Na redação o frio diário. Computador, escrevo, reviso, escrevo.

Café. Sempre tomo! Aqui é realmente muito frio.

Era uma matéria sobre “relações familiares”. A sugestão foi minha. Aceita. Fruto de uma pesquisa universitária tornou-se quase um projeto de vida. Cada estatística, cada contato, cada gravação. Tudo. E cá estou, escrevendo, revisando, escrevendo.

Acabou, leio pra ela:

− nossa! Ta ma-ra-vi-lho-so!

Sorri.

Tento ler. Tem um cara dormindo ao meu lado. Muita gente em pé, uma longa fila de carros.

Missão cumprida. Ela gostou, ela escreve bem, sabe o que é um bom texto. É.

− será que foi um acidente?

Algo me desassossega. Deixa-me ver: escrevi aquilo... coloquei a fala dele... Não, está tudo certo.

Aí que demora. Tem ar demais aqui. Mas como? Com tanta gente? Mas tem!

Ele entra gélido em mim. Parece que ta sobrando espaço, e ele esta circulando livremente dentro de mim, me fazendo ter calafrios e... dor de barriga. É. Eu estou nervosa e não sei com o quê...

− Aí que demora é essa?

Mas que vazio é esse aqui dentro? Não entendo, agora mesmo estava radiante com MINHA matéria.

Mas ai está! Não é por conta da matéria, sou EU. Isso. EU!

Acabei, fiz um ótimo trabalho, mas agora cá estou, tendo que aturar a mim mesma. Sozinha. Sem mas nada a fazer. Acabou!

− finalmente esse ônibus sai do lugar!

Foi um longo tempo perseguindo esta meta. Um bom trabalho, uma boa recompensa. Todos comentando o texto. “o glamour

A insaciabilidade desse objetivo se desfaz, desmancha. Todo aquele tempo como um meio de alcançar. Nada era o bastante, pois faltava alcançar, sempre.

Cheguei. É apenas desilusão.

Talvez seja melhor passar antes na casa dela. Acho que já está em casa. Tudo me lembra o que ela havia me dito antes. É. É melhor ir.

Meu tempo como um meio. Minha vida como um meio. E o fim desvanecido com o objetivo satisfeito. Que inútil.

Tudo isso. Tanto tempo perdido. Tantos sentimentos e vontades e repentes... adiados por um fim OCO!

Ta. Tudo bem. Que drama!

Eu ainda tenho muitas idéias, vontades, paixões...

Mas pra quê? Pra tudo se tornar pó, e se reconstituir, e ser pó de novo. É realmente inútil.

– MOTORISTA! vai descer!

terça-feira, 24 de junho de 2008

Vou fazer uma louvação, louvação, louvação!

De um simples nó, à imponência.

(- Mas não se deve esquecer aquele terno escuro... – como é o mesmo o nome? Ah! Terno EXECULTIVO. Isso.)

O desenvolvimento das competências multiplica o identificável. Assim, nos reconhecemos no outro. Com símbolos nos pés, nos óculos ou até mesmo nos dedos, nos integramos socialmente e exercitamos (porque não?) o poder.

A ostentação e o domínio dos recursos simbólicos, que dão alma ao que usamos, vemos, ouvimos ou lemos, é a pré-condição para o reconhecimento de um indivíduo na sociedade e torna-se indispensável, também, nas relações políticas e econômicas.

Cidadão assemelha-se ainda mais ao status (e ainda há quem diga que estamos na era da “sociedade interativa”).

A lógica é mais ou menos essa: com instituições públicas degradadas e falidas, os indivíduos recorrem às mídias (e outros meios), e mantêm-se informados sobre muitos de seus direitos e deveres, além de, muitas vezes, garantirem reparações sociais, que, normalmente, paralisariam na eterna burocracia dos órgãos públicos. Mas o que isso tem a ver com status e cidadania? Tudo. Sob esses encadeados de circunstâncias, a idéia de democracia e participação social sofreu alterações consideráveis. Isso, por sua vez, gerou uma sociedade desinteressada por política e pela coisa pública, ou seja, cada vez mais distante da idéia de coletivo.

O lugar foi cedido a uma cidadania de comportamentos e não de ações, do ter e não do fazer, das subjetividades simbólicas e não de “subjetividades ideológicas”.

A hierarquia social, dada pelo status econômico e profissional, é encarada como natural e aceitável como uma condição justa. Não por acaso, encontramos médicos exigindo um absurdo “ato médico” (somente os médicos poderão ocupar cargos de coordenação e chefia), discrepância de salários discriminada por cargos (e sexo, não esquecer!), empregados de cabeça baixa diante de patrões. São nesses termos que encontramos uma cidadania ao avesso. Uma cidadania para poucos, para os que têm condições de ser cidadão na plenitude do seu significado.

Enquanto uns usam a gravata, o nó aperta na garganta de quem nem sabe como fazê-lo. É na prática da subserviência que o processo de “interatividade social” ganha um sentido de dominação. A interação se dá em um único sentido: vertical, de cima para baixo. Interagimos sim, mas sob o comando das ordens que vem de cima. Do ponto mais alto dessa linha vertical, dividida por um nó de uma gravata.


Perils of Love...

"Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo a porta."

Arnaldo Jabor


segunda-feira, 23 de junho de 2008